Dois anos depois de ter decidido que os Correios têm o monopólio de entrega de cartas e correspondências, o Supremo Tribunal Federal deve voltar a se debruçar sobre o tema nesta quarta-feira (24/8). Está na pauta do plenário do tribunal um recurso em que a Associação Brasileira das Empresas de Distribuição (Abraed) pede que os ministros definam o conceito de encomenda, cuja entrega ficou fora do campo delineado pelo monopólio dos Correios. Ou seja, pode ser feita por empresas privadas.
A Abraed entrou com embargos de declaração porque as empresas de entrega de encomendas e outros tipos de correspondência têm enfrentado problemas por conta da abrangente definição que os Correios têm do conceito de carta. Como os ministros não detalharam, na decisão tomada em 5 de agosto de 2009, o que se encaixa no conceito de carta, na prática a batalha entre empresas de entregas e os Correios se mantêm. O relator dos embargos é o ministro Luiz Fux.
A advogada Ana Paula Barcellos, do escritório Luís Roberto Barroso & Associados, que representa a Abraed, explicou à revista Consultor Jurídico que o objetivo dos embargos é exatamente pacificar essa discussão que permanece aberta. “É necessário que o Supremo fixe alguns parâmetros para definir a abrangência do monopólio que, segundo a decisão do tribunal, foi recepcionado pela Constituição Federal”, afirmou Ana Paula.
No pedido ao STF, a Abraed alega que embora a decisão “tenha reconhecido que as encomendas não estão incluídas no privilégio postal, não esclareceu o que deve ser compreendido por encomenda”. Afirma, ainda, que “sem a definição dos elementos mínimos desse conceito, acabará mantida a insegurança jurídica e o risco de perseguição indevida a empresas regularmente constituídas. E até mesmo o risco de persecução penal injusta aos seus funcionários”.
Não apenas a Abraed, mas diversas outras entidades que representam empresas de entrega, como o Sindicato Nacional das Empresas de Encomendas Expressas, esperam que o Supremo defina que a entrega de talões de cheques e cartões de crédito de bancos não se encaixa no monopólio de entrega de cartas.
Falha postal
Em memoriais e documentos entregues aos ministros do STF, as entidades tentam demonstrar que o monopólio na entrega de cartões, por exemplo, prejudica os serviços prestados pelos bancos. Entre os documentos, estão ofícios enviados pelos Correios a bancos, nos quais a empresa de serviços postais demonstra não ter condições de cumprir com a tarefa.
Em dois ofícios enviados ao banco Santander em 2009 (clique aqui e aqui para ler), um gerente dos Correios em São Paulo informa que teve de suspender a entrega de cartões em regiões da periferia da capital paulista por questões de segurança. “Os nossos carteiros passaram a ser alvo de assaltos rotineiros em algumas áreas da região metropolitana de São Paulo, comprometendo tanto a qualidade de nosso serviço, quanto o bem estar e a segurança dos nossos colaboradores”, descreve o ofício.
Em razão do número crescente de assaltos a carteiros, “motivados pela posse desse tipo de objeto”, afirmam os Correios nos ofícios, a entrega dos cartões foi suspensa em bairros como Capão Redondo, Parelheiros e São Miguel Paulista, entre outros. A situação ocorre em diversos estados do país. Em outro ofício, com data desta segunda-feira (22/8), um gerente dos Correios informa ao Citibank a suspensão da entrega de cartões bancários por 60 dias, por conta do assalto a carteiros nas cidades de Maceió e Rio Largo, em Alagoas (clique aqui para ler o ofício).
Para as empresas de entregas, o Supremo precisa dar a resposta sobre o tipo de correspondência que está abrangida pelo monopólio dos serviços postais para solucionar um problema jurídico e operacional, já que os Correios não conseguem suprir a demanda. Há casos em que concessionárias de distribuição de energia elétrica, telefonia e água não conseguem entregar as contas aos clientes por conta dos mesmos problemas registrados com os cartões bancários.
Conceito de carta
A decisão do STF que manteve o monopólio dos Correios para os serviços postais foi tomada em 5 de agosto de 2009. Por seis votos a quatro, ficou definido que a Lei 6.538/78, que regula o sistema, foi recepcionada pela Constituição de 1988. Assim, cartas, cartões postais e correspondência agrupada só podem ser entregues pelos Correios.
No julgamento, também ficou claro que a lei que regula o setor precisa de regulamentação mais detalhada. Os representantes de empresas de entregas saíram satisfeitos pelo fato de ter ficado expresso que não haverá persecução penal por conta do trabalho com encomendas. Segundo eles, os Correios vinham provocando a instauração de ações penais contra empresas do ramo. Já representantes dos Correios saíram satisfeitos pelo fato de ter garantido sua fatia de mercado.
Apesar das definições, na ocasião do julgamento já se sabia que as discussões em torno da questão estavam longe do fim. O problema residia exatamente na interpretação do que é carta e do que é correspondência agrupada.
Um malote com documentos é facilmente identificado como correspondência agrupada, mas um presente enviado com uma longa carta é correspondência agrupada ou encomenda? A resposta pode ser dada pelo Supremo nesta quarta-feira.
Rodrigo Haidar é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
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